sexta-feira, 5 de julho de 2019

Itaqui antes da emancipação.



Itaqui antes da emancipação.

Distantes tempos do “já lá vão!”
Prof.º Paulo Santos

As referências básicas da história de Itaqui estão diretamente ligadas ao processo luso. Isto é, conhecemo-la como uma possessão portuguesa, a partir de 1801 e incorporada à jurisdição de São Borja. Antes disso, pouco se sabe deste riquíssimo território histórico-afetivo.
Em 1837 tornou-se freguesia (distrito) da secular redução missioneira, São Francisco de Borja, a primeira do segundo ciclo, passando a 6 de dezembro de 1858 à categoria de município através do gesto importante do juiz pernambucano, Dr.º Hemetério José Velloso da Silveira, que propôs a emancipação.
Entretanto, Itaquy (antes com esta grafia), já era credora de uma história pregressa singular. Muitas referências existem anteriores ao processo emancipatório. Inclusive, num relatório das autoridades desta região, consta que foi montado um “tribunal” para julgar a culpabilidade, ou não, dos padres jesuítas no não-cumprimento do Tratado de Madrid, quando várias reduções se insurgiram e não quiseram entregar as possessões e migrarem para o outro lado do rio Uruguai. Dom Diogo de Salas foi designado a estabelecer um quartel em São Borja para formar novo inquérito da questão da participação dos missionários. Dessa forma, em 1759, na organização deste “tribunal”, foi “entrevistado” um índio guarani do povo de São João Batista, no “Pueblo de Itaquy”. Os jesuítas foram absolvidos.
Se houve menção a este nome é porque em algum lugar devia haver este povoado, já que o povo que administrava estas terras era a redução de Nuestra Señora de Mbororé e Acaraguá (La Cruz) no lado ocidental. Isso posto, Itaqui seria um povoado jesuítico-guarani em alguma parte do vasto rincão. E, como diriam os galegos, “já lá vão” 260 anos, embora não se encontre na bibliografia das fontes missioneiras nenhuma alusão a tal localidade. Ou poderia, quem sabe, ser algum erro de registro da autoridade que notificou, no papel, o ato.
Esta região era um patrimônio do povo de La Cruz, redução jesuítica do outro lado do Uruguai,  usada para criação de grandes rebanhos de gado, tudo organizado em postos, currais, capelas ao longo das imensas sesmarias itaquienses. Tanto que era denominado “rincão da Cruz”.
Após a retomada do território ao domínio português, em 1801, aconteceram algumas tentativas dos espanhóis em reaver tal possessão.
Em 1816, o cacique guarani Andresito Artigas invade a região de Itaqui pelo Passo de La Cruz, cruzando o rio Uruguai e entrando pela barra do Cambaí, na época este arroio era chamado de rio Itaquy. Este caudilho missioneiro aniquilou uma guarda comandada  pelo furriel Atanásio José Lopes, que teve seus comandados e parte de sua família assassinados pelos invasores na estância São João, de sua propriedade.
Nesse período, a localidade de Itaquy possuía apenas alguns ranchos organizados em torno de uma pequena casa comercial, que servia de base para o contrabando com a Argentina
E desse evento “já lá vão” 203 anos e apenas sabemos algo somente após a emancipação.
Em 1821 havia uma capela jesuítica, denominada Santa Maria, próxima ao rio Ibicuí com dois marcos de pedra com inscrições em espanhol e emblemas da Companhia de Jesus. Neste mesmo ano, forças espanholas atravessam o Ibicuí chegando até Tuparaí, também uma antiga capela jesuítica.
Ao longo do imenso rincão usado para manuseio das grandes manadas do provo cruzenho, havia pequenos postos, guardas e capelas. um pequeno rancho servia de espaço para a presença do ato religioso imposto pelo colonizador jesuíta. Eventualmente, algum padre da redução ministrava missa em alguma dessas capelas. Parece que nenhum restou para consubstanciar aquele período.
Temendo novas invasões, o comando da fronteira estabelece no mesmo ano dos eventos anteriores (1821) uma guarda sob o comando do Tenente Fabiano Pires de Almeida com 150 soldados. Formaram um acampamento próximo da barra do Cambaí. Com as constantes cheias do Uruguai, foi este acampamento transladado para o atual centro da cidade. Consta que ali estaria o embrião do futuro povoado itaquiense. Vieram famílias argentinas para o local e outros emigrados fugindo das guerras fronteiriças. E “já lá vão” 198 anos.
A partir de 1822, Itaqui começa a estabelecer um intercâmbio regular com o povo correntino de Curuzu Quatiá. Por esta rota, ingressava erva mate exportada para outros portos que margeavam o Uruguai.
Em 1828, o caudilho oriental Frutuoso Rivera invade Itaqui pelo Passo do Mariano Pinto, destruindo a guarda comandada por este capitão. E “já lá vão” 191 anos. E neste ano há informação de um destacamento naval, comandado pelo Capitão Justo Yegros, em Itaqui.
A partir de 1846, São Borja sofre um processo de decadência e todo o comércio da erva-mate  vinda do planalto rio-grandense migra para Itaqui tornando-o empório das exportações do produto. A rota, originada nos países do Prata desembocava em Itaqui, com produtos e bens de toda a sorte e pessoas de diferentes nacionalidades.
Nossa idiossincrasia formou-se desta mescla fronteiriça – um pouco de índio, português, espanhol, italianos e alemães.
Itaqui sobeja em história anterior ao termo de São Borja.
Tentamos mostrar esta faceta pouco conhecida de nosso “rincão da Cruz”, São Patrício de Itaqui, embora muito ainda esteja soterrado sob a poeira do passado.


5 comentários:

  1. Excelente pesquisa professor. O passado, normalmente diz muito de nosso presente. Se ele for conhecido e entendido, podemos construir um futuro melhor do que, as vezes, o destino nos reserva.

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    1. Seria bom a identificação deste comentário, meu preezado amigo(a).ok?

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  2. Parabéns pelo informativo e bem escrito texto.

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  3. Parabéns Professor Paulo por contribuir com as pesquisas históricas e culturais de nosso Itaqui, como historiador você resgata e preserva a tradição daqueles que contribuiram para a formação de nossa sociedade.
    Os fatos descritos e narrados possibilitam aos conterrâneos e autoridades públicas de Itaqui a compreensão de que nossa Terra também faz parte das "Reduções Jesuíticas" a qual é reconhecida pela UNESCO como "Patrimônio Histórico da Humanidade".
    Volto a questionar o Poder Público do Município de Itaqui, para preservar e reconhecer estes registros como "Arquivo Histórico e Cultural da Humanidade". Itaqui precisa de força e influência política para incluir nossa cidade na "Rota das Missões".

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