sábado, 30 de setembro de 2017

Augusto Silveira Dutra

AUGUSTO SILVEIRA DUTRA

Uma partida de salteadores invadindo fazenda no Passo da Cachoeira! 1897!

Prof.º Paulo Santos

O passado rio-grandense é marcado principalmente por peleias. Seja no enfrentamento dos contrários para defenderem ideologias políticas, seja para fixar territórios, seja para preservar a honra, o patrimônio e, mais ainda, para consubstanciar a natureza guerreira do gaúcho.
Os confrontos para definir as fronteiras, os movimentos para definição de tratados, a Guerra Guaranítica, a Revolução Farroupilha, a Invasão Paraguaia, a Federalista e outros movimentos menores.
Quando não tinham peleias legais, os gaúchos inventavam. Após o cessar das hostilidades da Revolução Federalista, onde chimangos e maragatos se digladiaram numa sanha fratricida, os moradores dessas densas sesmarias ficaram receosos. Bandos armados invadiam fazendas, roubavam e exterminam famílias inteiras.
Uma das fazendas invadidas em Itaqui foi a de meu trisavô paterno, Augusto Silveira Dutra, primo do Coronel Felipe Nery de Aguiar, um dos líderes republicanos defensor da doutrina de Júlio de Castilhos.
Em 1897, a fazenda de Augusto fora atacada por uma partida de salteadores, no local denominado Passo da Cachoeira. Recolhi de um tio-avô este relato. Eram em torno de 12 homens, todos com “a cara pintada de preto e encarnado”, conforme depoimento.
No dia do ataque, Marcino de Aguiar, filho de João Pinto de Aguiar e Maria Joaquina de Medeiros, neto de Ignacio Pinto de Aguiar (meu tetravô paterno) e outro menino, de apelido Bilica, estavam no mato cortando lenha. Uma filha de Delfino, irmão de Augusto, foi até eles e avisou que os bandidos estavam atacando a sede da fazenda.
Eles, então, correram para o local. Ali, o velho Augusto comandava a defesa da casa. No decorrer do episódio, o estancieiro incentivava a Marcino, novo, imaturo e nervoso e mais o outro garoto a reagirem. Ele gritava: “ - Não se entreguemo pra bandido! Não se entreguemo pra bandido!”
No confronto, Augusto foi ferido numa perna e continuou reagindo, pedindo que as mulheres municiassem a arma com que atirava na quadrilha, sentado em uma cadeira. As mulheres também preparavam água fervida para atirar nos invasores. Coisa feia o quadro!
A esposa de Augusto também foi atingida. Os defensores da casa acertaram um dos invasores. O grupo de salteadores, não podendo socorrer ao ferido, resolveu degolá-lo para que, posteriormente, não os delatassem.
Meu bisavô Higino Francisco dos Santos e Tomé Oviedo também estavam na confusão. Informações algumas indicavam que um dos quadrilheiros seria um genro de Augusto, de sobrenome Ramos. Existe, inclusive, um relato policial desse incidente. Augusto Silveira Dutra teria ficado “manco” de uma perna devido ao tiro sofrido.
Foto acervo de família. Período aproximado de 1900 a 1915


Ele fora anteriormente integrante da Guarda Nacional de Itaqui, por volta de 1879, um furriel da 4.ª Cia do Batalhão do Serviço Ativo. Em documentos de 1906, Augusto aparece nomeado como Tenente-Coronel do Estado Maior. Esse, assim, como outros, era uma graduação efêmera, dada ao sabor das refregas e com interesses imediatos e específicos. É claro que ele não era um oficial de carreira, apenas um título recebido naquele período para chefiar, como oficial, determinado regimento. Seria uma “graduação arrumada”!
Como o clima de tensão e insegurança era frequente naquele período, seu primo, o Coronel Felipe Nery de Aguiar, intendente de Itaqui e líder político dos republicanos, eventualmente autorizava que um soldado da Guarda Municipal fizesse a vigilância da fazenda de Augusto, no Rincão da Cachoeira. Benesses entre parentes!
A reação de Augusto e sua gente impediu que a quadrilha invadisse a propriedade e cometesse as atrocidades que bandos dessa natureza frequentemente cometiam. No meio do entrevero choveram balas de tudo que era calibre, panelas de água fervente, muita munição e gritos de “não se entreguemo pra bandido”!
E não se entregaram mesmo! Esses flashes do passado são singulares.


sexta-feira, 29 de setembro de 2017

Itaqui no alvorecer do séc. XX - O guarda-sol assassino!

Itaqui no alvorecer do século XX
O guarda-sol assassino!
Prof.º Paulo Santos
Acionamos a televisão e os telejornais nos bombardeiam com os crimes mais inusitados, hediondos ou curiosos. Ficamos a conjecturar – afinal, isso são coisas de cidade grande. Vivemos logo abaixo do continente. Sim, aqui há também vida inteligente, mas estamos longe das catedrais. Longe das capitais. Estamos longe da efervescência midiática.
Pois ao estarmos longe, o contraditório se instaura.
Será que em Itaqui temos fatos singulares ou próximos das grandes metrópoles, onde a fobia da paz se consolida, onde o frisson do novo e do inexplicável atordoa a mente das gentes?
Pois sim! Aqui ocorreram fenômenos próximos do impensável.
Mexendo na poeira do tempo, um sopro para dissipar a névoa da distância e da clareza do fato, encontramos um achado curiosíssimo sobre o Itaqui antigo. Alvorecer do século XX. Ano: 1911.
foto da área central de Itaqui à época desse fato curioso

Notícia de Itaqui, sabe onde? Lá pelos lados de Alagoas. O jornal  O Gutenberg, em sua edição n.º 188, de 30 de agosto de 1911, dizia que “nas proximidades de uma pequena villa no município de Itaquy” um fato assaz diferenciado ocorreu.
Uma senhora viúva, de nome Arminda Alves, saiu de Santiago do Boqueirão com destino a São Borja, em companhia de um peão, chamado Estevam, de 18 anos.
A dita senhora viajava a negócios. No meio do caminho, numa vila de Itaqui, o rapaz que a acompanhava intentou de atacá-la, tentando feri-la com um enorme facão, exigindo que a mesma lhe entregasse várias libras esterlinas que carregava.
O jornal conta que a viúva defendeu-se como pôde, lutando contra o agressor, mais jovem e com um facão. Uma luta desigual. Todos imaginam o final.
Pois a dita senhora, num momento de defesa contra o jovem assaltante, desferiu-lhe violento golpe na região temporal direita, causando-lhe morte instantânea.
Arminda Alves golpeara o forte e saudável agressor sabe com o quê?
Ora, ninguém acreditaria!
Só em Itaqui para acontecer. Logo aqui, que estamos tão longe das capitais!
A emponchada viúva de libras esterlinas defendeu sua vida heroicamente, desfechando o derradeiro golpe no agressor, com o seu guarda-sol!

Pode? Um século atrás nos presenteia com esse singular relato, no Itaqui republicano do intendente Tito Corrêa Lopes.

Vigário José Coriolano de Sousa Passos

VIGÁRIO JOSÉ CORIOLANO DE SOUSA PASSOS
O patriarca da Família Passos de Itaqui.RS
Esta casa ficava na esquina da Independência com João Dubal Goulart. Acredita-se que após os anos 70 teria sido desativada.


 Prof.º  Paulo Santos

A família Passos, de Itaqui, através de alguns de seus componentes, costumava afirmar que descendia de um padre. Esse conceito parecia um tanto curioso, dado ao fato de não ser permitido aos vigários terem filhos, ainda que na história antiga do Rio Grande do Sul ocorressem casos onde os sacerdotes se envolviam em relacionamentos, advindo daí filhos, alguns reconhecidos, outros, não. No entanto, em Itaqui, os dados pesquisados dão sustentação a essa verdade, amparados ainda pela versão oral.
Inicialmente, há que se considerar que Itaqui, por volta de 1850, período onde inicia a história do referido religioso, era ainda uma freguesia pertencente a São Borja, o primeiro dos Sete Povos das Missões, no segundo ciclo missioneiro. Sobre esse ambiente inicial, convém citar o que o pesquisador, padre RUBBERT, expõe:

Aos poucos, junto ao rio Uruguai, num pequeno elevado, surgiu a povoação chamada Itaqui, que custou a se desenvolver. Não obstante, cedo se tornou paróquia por lei provincial de 23 de dezembro de 1837, tendo como padroeiro S. Patrício. A aprovação canônica demorou alguns anos, pois só a 9/3/1838 foi nomeado pároco o Pe. Marcelino Lopes Falcão. A 5/1/1839 esteve em Itaqui em visita canônica o Pe. Fidêncio José Ortiz da Silva. Que achou a povoação insignificante com um pequeno templo feito com esmolas dos fiéis, carente de alfaias. A população da freguesia era de 2.500 almas. Crismou 720 pessoas.

Pois nessa “insignificante povoação” veio, mais tarde, de São Paulo, o nosso primeiro padre nomeado. Muitas fontes foram utilizadas para que tal pesquisa tivesse consistência e veracidade.
José Coriolano de Sousa Passos, o padre em questão, nasceu em 22 de abril de 1815, na freguesia de Santa Ana da Laguna, província de Santa Catarina. Era filho do alferes Manuel de Sousa Passos Ribeiro e de Matilde Rodrigues de Oliveira. Seu pai era de Santa Catarina, e a mãe, de Santo Antônio da Patrulha, Rio Grande do Sul.
Seus avós eram Manuel de Sousa Passos Ribeiro e Catarina Gonçalves Ribeiro. Seus bisavós eram Manuel Gonçalves Ribeiro, da freguesia de São Mateus do Bunheiro, distrito de Aveiro, situado entre Coimbra e o Porto, em Portugal, casado com Maria dos Passos, natural de Paranaguá, falecida antes de 1727. O bisavô veio de Portugal, chegando ao Rio de Janeiro, dali para Santa Catarina.
Coriolano foi ordenado presbítero a 3 de maio de 1841, em São Paulo, por Dom Manuel Joaquim Gonçalves de Andrade, Bispo daquela província.
Em 28 de agosto de 1841 foi nomeado padre coadjutor de Desterro, uma localidade de Santa Catarina. Já em 10 de maio de 1842 era designado como coadjutor de outra freguesia, São José, na mesma província. Em 2 de março de 1844, nomeado pároco da mesma paróquia. No ano seguinte vem para a província do Rio Grande do Sul.
A primeira localidade onde o distinto religioso foi prestar seus serviços foi a paróquia de São Francisco de Borja, nomeado pároco e vigário da referida Vara em 01 de abril de 1845.
Desta povoação missioneira, o mesmo foi designado para a freguesia de São Patrício de Itaqui, então como nomeado em 18 de julho de 1850. Seria, de fato, o 1.º padre e o 1.º vigário da Vara. Os relatos canônicos indicam que Coriolano era zeloso do culto divino e dedicou-se à construção da matriz da Villa. Entretanto, diante de denúncias que acreditam os pesquisadores serem devidas ao fato de que o vigário teria feito inúmeros batismos de estrangeiros, principalmente de Alvear, Argentina, o mesmo chegou a ser suspenso em 1856. Com relação a esse fato, há que se considerar o que encontramos em FREDERICO PALMA (1993):

Fue preocupación de los hombres de gobierno, la falta de sacerdotes que atendiesen esa amplia zona de costa Correntina sobre El rio Uruguai. Los departamentos de Santo Tomé y La Cruz – decia El gobernador Balciene em sua mensaje de 1870 – hacia mucho tiempo que reclamaban um pastor espiritual sin poder conseguir a causa de la enorme distancia a que se encuentran aquellos pueblos. Uma de la razones más fundamentales que El gobierno tênia para empeñarse em proveer aquellos curatos era la de que los niños nacideos alli se llevaban a bautizar em el Brasil y eram inscriptos em los libros de parroquiales com súbditos de aquel país.

O padre José Coriolano batizava as crianças argentinas porque não havia quem o fizesse no lado de lá. Isso não era permitido, portanto a denúncia. No entanto, há que destacar que os argentinos reconheciam a boa vontade do referido sacerdote, pois o mesmo Palma destaca que “...estuvo por entonces atendido em lo espiritual por el presbítero José Coriolano de Souza Passos, vicário de la parroquia de San Patrício de Itaqui (Brasil)”
Em 28 de outubro de 1859 era nomeado Pároco Colado. A confirmação desse cargo deu-se em 10 de abril de 1860, pelo Bispo Dom Sebastião Laranjeira. No dia seguinte recebeu a Colação.
No dia 28 de agosto de 186, Itaqui recebe a visita do Bispo, Dom Sebastião Dias Laranjeira. Sobre o referido sacerdote, o Bispo, autoridade maior da província, assim se referia:
“...embora não seja de grandes conhecimentos, exerce o ministério com aceitação e aproveitamento dos fiéis, gozando naquela paróquia, por sua moralidade e severos costumes de respeito e estima dos povos, como tive ocasião de testemunhar durante os dias que aí me demorei em Visita Pastoral.”

Dom Sebastião achou o arquivo da paróquia em ordem, partindo bem impressionado do pároco e do lugar. Quando sua Eminência aqui chegou, Coriolano já estava há 14 anos. O Bispo a tudo examinou, demorando-se alguns dias em Itaqui. Ainda em São Borja, o padre Passos já recebera elogios do padre visitador Fidêncio, no Natal de 1848, referindo-se a ele como: “Sacerdote de exemplar conduta, pronto no cumprimento de seus deveres e geralmente estimado de seus fregueses.” Também lá esteve empenhado na construção de uma nova matriz para a igreja do povo.
Em Itaqui, documentos de 1865, época da invasão paraguaia, como atas de eleições, de alistamento eleitoral, dão conta de que José Coriolano teria 52 anos de idade, tendo, dessa forma, nascido em 1813. Não se sabia de onde era natural, nem tampouco sua filiação. Pressupunha-se fosse originário de São Paulo pelas pistas encontradas na pesquisa. Os familiares atuais indicavam de que o mesmo era oriundo do referido estado. Os dados confirmaram esses indícios.
As primeiras evidências da participação de Coriolano, em Itaqui, datam, por exemplo, de 11 de março de 1855, quando o mesmo era responsável pelo registro das terras da Villa de São Patrício. Durante muito tempo, a Igreja era encarregada do Registro Paroquial, onde os proprietários eram obrigados a registrar suas sesmarias, no que revertia em tributos para a ordem religiosa.
Já em 1853 há documentos que atestam ser José Coriolano um dos que defendia a instalação de uma Mesa de Rendas para Itaqui, uma briga que se consolidou com o trabalho do juiz Hemetério José Veloso da Silveira, quando em 1857 sugeriu que os habitantes pedissem à Assembléia Provincial a emancipação de Itaqui ao termo de São Borja. Em 1858 foi tal ato aprovado, tendo o colega de Coriolano, o cônego João Pedro Gay, travado uma discussão muito séria com Hemetério, excomungando-o da Igreja. O padre João Pedro Gay era vigário da Paróquia de Santa Ana da Laguna, SC, em 1843. Nessa época, José Coriolano ainda estava por lá.
Há registro da participação do ilustre vigário na Guerra do Paraguai, na função de Capelão, Tenente de Comissão, conforme indica a Ordem do Dia N.º 85, de 30 de novembro de 1865, do Ministério da Guerra. Não se sabe se efetivamente participou da Guerra ou esteve nomeado nesta função, permanecendo por aqui.
Entretanto, quando o Imperador D. Pedro II visitou Itaqui em setembro de 1865, ali estava, colaborando na recepção ao monarca e toda sua comitiva, composta de seus genros, de outros nobres, de militares, além do Marquês de Caxias, que permaneceu no barco no meio do rio Uruguai por se encontrar adoentado. O padre Passos recepcionou D. Pedro II, juntamente com o Venerável Cônego João Pedro Gay, emérito escritor da História da República Jesuítica do Paraguai. Desde o descobrimento do Rio da Prata até nossos dias, anno de 1861, Rio de Janeiro. Dom Pedro II conversou demoradamente com o padre José Coriolano de Sousa Passos.
Mais tarde, vamos encontrar o padre Passos reivindicando ao Governo Imperial o ressarcimento das perdas sofridas com o roubo das alfaias da igreja durante a invasão do exército paraguaio. Um dos vereadores um tempo depois, Luiz Peixoto do Prado, informava em documento de 18 de maio de 1874 o seguinte: “Os ornamentos e livros saqueados de uma casa de comercio para onde o vigario (finado) José Coriolano de Sousa Passos os deixou guardados em sua retirada”.
Com relação ao ressarcimento dos prejuízos, a documentação consultada nada indica que o mesmo tenha tido sucesso, pois bem se sabe que as vilas invadidas não foram indenizadas. Entre tanta gente que batizou, podemos citar, por exemplo: Aureliano Pinto Barbosa, em 14 de junho de 1862. Antes, em 26 de outubro de 1859 pôs os santos óleos em Rufino, filho de meu tetravô paterno, Ignácio Pinto de Aguiar e Fermiana Roza de Lima, apenas para citar dois casos.
Em 10 de fevereiro de 1862 aparece o registro do padre Coriolano como delegado da instrução pública de Itaqui, sendo responsável pela fiscalização das provas e exames dos alunos e demais rotinas da educação naquela época, de moral e conduta rigorosas. Um pouco antes, em janeiro de 1859, o governo municipal havia fechado a escola pública. O padre Passos discute o destino dos materiais da escola, sugerindo que os mesmos fossem guardados na Câmara até que aquela cadeira fosse de novo provida de professor, já que seu primeiro titular, Pedro Antonio de Miranda, não quis ficar na função devido à baixa remuneração.
O reverendo em questão morava em 13 de março de 1868 na rua 7 de setembro, hoje Independência. Segundo o falecido pesquisador e artista plástico, Jorge Vômero, a casa do padre Passos seria no local onde hoje fica a sede da seita Jhorei, esquina da Independência com João Dubal Goulart, informação comprovada pelo Inventário de 1873.
Detalhe da casa do padre, ao lado da Casa Degrazia, no lado esquerdo.

Quando foram escolhidos 7 eleitores para a Paróquia de Itaqui, no dia 3 de fevereiro de 1869, às 9 horas da manhã, na matriz da igreja, José Coriolano de Sousa Passos, o vigário da Villa de São Patrício de Itaqui, recebeu 114 votos, concorrendo com militares mais conhecidos da região, dentre eles o Coronel Antonio Fernandes Lima, que recebeu 121 votos, o mais votado.
O vigário Passos chegou a ser indicado para concorrer para vereador da Villa (denominação pela qual Itaqui era conhecida, pois somente passa à cidade em 1879). Numa dessas eleições, ficou em segundo lugar, no entanto não foi nomeado, como pudemos constatar.
Em pesquisa no Arquivo da Câmara de Vereadores de Itaqui, encontramos a evidência de que o padre José Coriolano de Sousa Passos tinha um filho. No Livro 1876, da Junta Eleitoral, que contém as atas de alistamento consta o seguinte: “Israel Coriolano de Sousa Passos, idade 35 anos, empregado público, filiação: José Coriolano de Sousa Passos. Já havia alguns relatos orais por parte de alguns descendentes da família Passos que confirmavam essa constatação.
Em busca no site de pesquisa genealógica – familysearch.org – dos mórmons, há o seguinte registro: Israel Coriolano de Sousa Passos, batizado em 7 de agosto de 1840, na paróquia de Nossa Senhora de Assunção, São Paulo. Filho de Joze Coriolano de Sousa Passos e Maria Magdalena Machado Bueno.
Portanto, um ano antes de ser ordenado padre, Coriolano tivera um relacionamento com Maria Bueno, vindo a nascer Israel. Pelo que se entende, o padre trouxera esse filho para o Rio Grande. Israel quando aqui chegou tinha 5 anos. Quem será que o cuidava?
As informações sobre Israel são muitas em Itaqui. Israel Coriolano foi secretário interino da Câmara de Vereadores, também chamada de Conselho Municipal, em janeiro de 1865, um pouco antes da invasão paraguaia por parte das tropas de Solano Lopes, comandadas pelo Coronel Estigarribia.
Esse Israel teria nascido entre 1839/1843, conforme alguns registros da Guarda Nacional do qual foi por durante certo tempo membro ativo. Em 25 de agosto de 1880 foi nomeado de Tenente para Capitão, lotado na 3.ª Companhia, Batalhão de Infantaria N.º 5, do serviço ativo da Guarda Nacional de Itaqui.
Itaqui ficou conhecida por ambientar um famoso romance – o da jovem itaquiense Emília Josefina Coimbra de Mello com o Tenente, do Rio de Janeiro, suposto descendente de Vasco da Gama, futuro Almirante da Marinha brasileira, Luís Felipe SALDANHA DA GAMA.
Eles vieram a casar em 28 de janeiro de 1867, em Itaqui, ofício religioso esse celebrado pelo padre José Coriolano de Sousa Passos, na segunda igreja de Itaqui, no beco de São Patrício. O enlace durou apenas oito dias. O Tenente fora chamado para a Guerra do Paraguai, em pleno andamento. Mila, como era conhecida, ficou sozinha, sem notícias do oficial, seu marido.
Nesse intervalo, conta a tradição oral de que fora cortejada por alguns pretendentes da cidade. Entre esses, destacava-se o jovem Israel de Sousa Passos, na época com 27 anos. Entretanto, mais tarde, desiludida do marido, que não retorna da Guerra e nem dá notícias, Mila casa-se com estancieiro de São Tiago do Boqueirão, Antônio José Barcelos, bem mais velho do que ela.
Após esse período, Israel contrai matrimônio com Mercedes de Sousa Passos, cujo nome de batismo era Mercês Luíza, ou ainda Maria das Mercês Gonçalves Belmonte, que era natural de São Paulo. Era filha do Coronel Manoel Luiz de Souza e de Balbina Gonçalves. Entre os filhos que se tem notícia de Mercedes e Israel constam:
1.    Maria da Conceição, nascida em 8 de outubro de 1874;
2.    Pedro de Sousa Passos, nascido em 1871, Major secretário do Estado Maior do 17.º Corpo Provisório de Cavalaria sob o comando do Tenente-Coronel Maximiano Teixeira Coelho, na Revolução de 1893, em Itaqui;
3.    América Barbosa, casada;
4.    Astério de Sousa Passos, nascido em 3 de agosto de 1883, batizado pelo padre Nápoles Massa em 13 de outubro de 1885 e falecido, com 52 anos, em 11 de agosto de 1936, em Itaqui. Astério era casado com Maria da Glória Rosa Passos, que teriam os filhos: um de nome Israel da Rosa Passos, nascido em 1916 e casado com Fany Nunes Ramos, em 2 de janeiro de 199; outro de nome Manoel Bráulio da Rosa Passos, nascido em 1921, casado em 6 de outubro de 1950, com Erci Nunes Ramos – dois irmãos passos com duas irmãs Ramos; Hectelindo e Astério Filho, são outros filhos, além de Irma Passos, nascida em 1918 e falecida em 20 de dezembro de 1933, com 15 anos;
5.    Maria Magdalena, nascida em 27 de maio de 1882 e batizada em 16 de fevereiro de 1883;
6.    Maria Balbina, nascida em 23 de junho de 1885 e batizada em 13 de outubro de 1885, casada na capital federal, Rio de Janeiro, com o Contra-Almirante Agenor Vidal, em 29 de janeiro de 1901;
7.    Alípio, nascido em 1860 e falecido em 11 de junho de 1880.
O Coronel Manoel Luiz de Souza e Balbina Gonçalves, além de Mercedes, eram pais de:
1. Balbina Gonçalves de Sousa (Biquinha), falecida em 14 de fevereiro de 1966, em Itaqui, casou em 29 de junho de 1896, com Luiz Acilino Palmeiro ( nascido em 17 de julho de 1872 e falecido em 26 de outubro de 1962, filho de Amâncio Palmeiro e Lara Palmeiro, bisneto de Floriano Machado Fagundes, o tronco basilar da família Floriano, na fronteira oeste).
2. América Gonçalves de Sousa, esposa do Dr.º Aureliano Barbosa, intendente de Itaqui e deputado estadual.
Com relação a Israel, os documentos da Guarda Nacional indicam que em 1860, com a idade citada de 20 anos, solteiro, padecia de completa surdez. Com 30 anos de idade era Alferes Honorário da GN de Itaqui. Parece que um descendente contemporâneo da família, falecido, sofria do mesmo problema, com dificuldade na audição.
Em 11 de maio de 1872, Israel aparece como testemunha de casamento em Itaqui, quando era pároco interino, Antonio Guido. O interessante é que Israel é citado como testemunha em registros de batismos anteriores, onde José Coriolano, seu pai, era o padre oficiante.
Em 1880, Israel de Sousa Passos era o 3.º suplente de Juiz Municipal de Órfãos de Itaqui. No mesmo ano, 18 de fevereiro, era nomeado 3.º suplente de vereador. No ano de 1882 detinha o posto de delegado de Polícia da cidade. Novamente, em 3 de julho de 1889, sendo presidente da Câmara de Vereadores, o Dr.º Eduardo Fernandes Lima, foi nomeado para comandar, pelo governo do Estado, a força policial de Itaqui.
A esposa de Israel, Mercedes de Sousa Passos, teve seu falecimento publicado pelo Jornal de Itaqui, edição de 30 de maio de 1928, com idade bem avançada. Em algumas fontes, Israel surge como natural de São Paulo (Arquivo da Cúria Diocesana de Uruguaiana, Livro (-B, p.3v, 1885). Em anotações do Cartório de Registros de Imóveis e Especiais, de Arlindo Siqueira Dias, consta que Manoel Luiz de Souza, sendo nesta data (1889), era morador da província de Entre-Rios, na Argentina.
Quanto ao vigário José Coriolano de Sousa Passos sabe-se que o casamento do Tenente Saldanha d Gama com a itaquiense é um de seus últimos registros, conhecidos, como padre. Conforme o historiador Jesus Pahim, o padre Passos teve destacada atuação em Itaqui, pois “O seu envolvimento com a comunidade foi muito grande. Por iniciativa sua, construiu-se a primeira igrejinha de Itaqui. Foi edificada em pedra, com cobertura de capim Santa-Fé.” Seu nome foi importante também no processo de emancipação do município.
Em 17 de abril de 1873, o Bispo do Rio Grande do Sul recebe uma comunicação de Itaqui sobre o falecimento do vigário Passos. O passamento se deu em 14 de outubro do mesmo ano. A correspondência se dirigia desta forma:

BISPADO DE SÃO PEDRO DO RIO GRANDE DO SUL
Palácio Episcopal em Porto Alegre
16 de maio de 1873.
Ilmo. Sr.
Acusando a recepção do officio de VV.SS. com data de 17 do mês findo, em que me dão a infausta notícia do passamento do R.do Vigário dessa Villa p.º José Coriolano de Sousa Passos; cumpre-me declarar-lhes que a brevidade possível será Ella provida de Parocho confirmando entretanto na sua administração o respectivo coadjutor enquanto aí não se apresente o novo Parocho.
Deus guarde a VV.SS.ªs.
(assinatura) Bispo do Rio Grande
AOS PRESIDENTE E DEMAIS MEMBROS DA CÂMARA MUNICIPAL DA VILLA DE ITAQUY

Os relatos desse período são fragmentados, não pudemos conseguir mais dados sobre seu falecimento, pois os arquivos da Prefeitura, Câmara, Paróquia e Bispado nada indicam sobre esse fato.
Em 1873 foi aberto o Inventário do Vigário Passos, hoje no Arquivo Público do Rio Grande do Sul (Autos: 222, Maço: 7, Estante: 114, Cartório de Itaqui- Órfãos e Ausentes – Inventários, Ano: 1873).
Conforme a descrição do referido documento, somente um único herdeiro havia – seu filho Israel Coriolano de Sousa Passos. Consta que não foi feito testamento. Os bens deixados pelo reverendo eram os seguintes, conforme descrição textual do documento pesquisado:
Ø  “Uma morada de casa situada na praça da Matriz desta Villa fasendo esquina com a rua da Igreja, frente ao Oeste com a mesma praça, frente ao Norte com a rua da Igreja, limitando-se pelo Sul com o terrenos do mesmo Inventariado e pelo leste com terrenos de D. Leonarda Canepa, e Evaristo Teixeira do Amaral, tem na frente de Oeste cem palmos, com cinco janellas todas envidraçadas, e um grande portão de ferro; e na frente de Norte cento e cincoenta palmos, trez janellas todas envidraçadas, um grande portão, um grade telheiro todo repartido junto e contíguo a mesma caza, cosinha, e posso de balde, toda a caza é construída de pedra e cal, e um quintal todo cercado de muro de pedra: o que tudo sendo conhecido dos avaliadores. Declararão valor: vinte e seis mi contos de réis, que sai 26:000:000.
Ø  Um terreno contíguo a mesma caza com trezentos e oitenta palmos de frente a Oeste, e trezentos e cincoenta palmos de frente a Leste, limitando-se com a rua do Ipiranga, pelo Norte com a caza ocupada pelo inventariante, todo plantado e lagiado todas as veredas, todo cercado com um muro de pedra de nove palmos de altura que os avaliadores declararão valor: quatro contos de réis, que sai 4:000:000.
Ø  Uma marqueza em bom estado que os avaliadores declararão valor vinte mil reis, que sai 20:000.
Ø  Um sofá de palhinha que os avaliadores declararão valor cincoenta mil réis, que sai a margem 50:000.
Ø  Quatro aparadores (acento de mármore) que os avaliadores declararão valor a cincoenta  e dois mil cada um e todos por dusentos e trinta e dois mil réis, que sai a marge: 232:000.
Ø  Quatro cadeiras de braço, de jacarandá, a vinte mil réis, oitenta mil réis, que sai para – 80:000.
Ø  Dose cadeiras acento de palhinha, madeira de jacarandá novas, por cento e vinte mil réis. 120:000.
Declara o inventariante não ter mais bens a descrever; e com o Medico, Botica, funeral e Missa de sétimo dia despendeu a quantia de um conto e dusentos mil réis. 1:200:000.”
Pela leitura do texto do Inventário, entende-se que a casa do Vigário José Coriolano de Sousa Passos é a mesma que na década de 70 ainda existia, passando mais tarde para a família Palmeiro, sendo seu proprietário o sr. Amâncio Palmeiro, filho de Maria Leopoldina Floriano e João José Fontoura Palmeiro (que fazia parte da primeira Câmara de São Borja e um dos líderes militares da região).
Uma cunhada de Israel Coriolano, Balbina, casou um Palmeiro (Luiz Acilino e tiveram 11 filhos. Possivelmente, é através dessa ligação que se explica a antiga casa do Padre José Coriolano de Sousa Passos pertencer mais tarde a Amâncio Palmeiro.
Casa de Luiz Acilino Palmeiro, casado com uma cunhada do padre Coriolano. Esta casa ainda existe.

O local da localização da mesma e do terreno é o seguinte: Hoje corresponde a todo o terreno da sede da seita Jorhei, que seria a parte da casa, indo até a esquina dos Correios, que corresponderia à parte dos terrenos. Portanto, toda a parte da frente da quadra da Independência, no lado esquerdo, frente à Praça Matriz, pertencia na época ao Padre Passos. Não deixou campos, gado, nem ouro e prata. Os bens relacionados eram singelos. Com certeza, a casa e os terrenos deviam ser concessões que a própria Igreja permitia aos reverendos no exercício do cargo.
Em seu lugar viria o também conhecidíssimo José de Noronha Nápoles Massa. Sobre José Coriolano foi possível reunir um bom conjunto de informações, antes não havidas na cidade: algumas até inéditas.
A comunidade precisava conhecer um pouco mais sobre esse que foi o primeiro padre de Itaqui, sua inserção no processo da identidade civil e religiosa do Rincão da Cruz. Observação: Por envolver, nomes, datas e fatos antigos, pode ser que alguma informação não proceda. Isso é possível. Acréscimos são bem vindos!



sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Emília Josefina Coimbra de Mello - a Mila!

EMÍLIA JOSEFINA COIMBRA DE MELLO
A MILA
Uma itaquiense casando com o maior herói da marinha brasileira. Pode?!
Pesquisa: Prof.º Paulo Corrêa dos Santos

Foto da obra de Godofredo Tinoco, 1956, raridade, em nosso poder. Mila, quando do casamento com Saldanha da Gama

Emilia Josefina Coimbra de Mello era filha de José Caetano de Mello e Auta Coimbra de Mello. Nasceu em Itaqui, em 27 de agosto de 1850, sendo batizada em 21 de setembro de 1850.
Casou oficialmente com o Tenente da Marinha Brasileira, Luiz Felipe Saldanha da Gama, que servia na Flotilha do Alto Uruguai, sediada na barra do Cambaí, a partir de 1866. O casamento foi oficiado pelo primeiro padre de Itaqui, José Coriolano de Sousa Passos. O mesmo padre que deu origem à família Passos em Itaqui, RS. O enlace durou apenas 8 dias. Saldanha da Gama fora chamado para o teatro da Guerra do Paraguai que se desenrolava então, nunca mais se encontraram.
Mila, como era conhecida Emilia Josefina, veio a se unir com o estancieiro de Santiago do Boqueirão, Antonio José de Barcellos, mais velho do que ela, Com Antonio José de Barcellos veio a ter os seguintes filhos:
1.    Otávio José de Barcellos ou Mello Barcellos (não se sabe bem como foram registrados, mas predominava o nome do pai, visto que não eram casados oficialmente). Otávio foi batizado por José Caetano de Mello Filho, irmão de Mila. Acredita-se que Otávio tenha casado com Amália Barcellos;
2.    Ramiro José de Barcellos, batizado em 1877, pelos avós maternos José Caetano de Mello e Auta Pereira Coimbra de Mello. Ramiro, em 1902, aparecia como Tenente-quartel-mestre, da Guarda Nacional. Em 1910, era Major-fiscal desta mesma instituição. Ramiro seria casado com Margarida Frota Barcellos, sendo pais de:
2.1.        Pedro Emílio, batizado em 16 de julho de 1916, nascido em Santiago do Boqueirão, em 02 de junho de 1916;
2.2.        Ramiro Frota de Barcellos, nascido em Santiago, em 20 de abril de 1905, falecido em Porto Alegre, em 22 de setembro de 1983;
2.3.        Mário, nascido em 27 de março de 1914, e batizado em 16 de julho de1916, em Santiago do Boqueirão
3.    Annibal José de Barcellos, batizado em 1878, pelos tios Hildebrando Caetano de Mello e Maria Evangelina. Annibal faleceu precocemente, ainda criança;
4.    Cyro José de Barcellos nasceu em 1883, batizado por Jerônimo José de Barcellos e Baldira Ramos Viana. Cyro em 1902 era Alferes da Guarda Nacional. Há informação de que fazia parte da diretoria que fundou o Colombo Futbal Club, de Pelotas;
5.    Rosa José de Barcellos ou Mello Barcellos, nascida em 26 de junho de 1880, batizada em 05.07.1881, em Itaqui, batizada pelo Capitão Francisco José da Cruz e Julieta de Mello Barcellos, sua tia;
6.    Ada, sem maiores dados; casada. Ada foi com quem Mila foi morar no Rio de Janeiro a partir de julho de 1931, tinha como filhos:
6.1.        Pompeu Barbosa de Mello, formado em Medicina, no Rio de Janeiro (nessa época, o nome da avó aparece como Emilia Barbosa de Mello – não se sabe por que o sobrenome Barbosa noticiado pela imprensa carioca);
6.2.        Dalila Frota de Matos casada com Dr. Leônidas Anthero de Mattos. Dalila e Dr.º Leônidas eram pais de:
6.2.1. Arthur Frota, nascido em 1922;
6.2.2. Leônidas, nascido em 1924;
6.2.3. Anthero;
7.    Maria, falecida em Itaqui, aos cinco dias de agosto de 1882, com 17 dias de existência.
Mila fora batizada na igrejinha do Beco (hoje chamado de Beco Antonia Loureiro, ao lado da atual Câmara de Vereadores), chamada de Nossa Senhora da Conceição. Seus padrinhos de batismo foram os avós maternos Francisco José Pereira Coimbra e Maria do Carmo Aguiar Coimbra. A crisma deu-se na nova igreja, frente à praça, na localização atual, em 04 de abril de 1864, pelo então Bispo, Dom Sebastião Laranjeiras, como madrinha a avó, D. Figueiredo Pereira. O padre que a batizou foi José Coriolano de Sousa Passos.

Foto da obra citada, acervo do autor

Mila era prima-segunda do Coronel Felipe Nery de Aguiar, primeiro intendente de Itaqui e líder militar na Revolução Federalista.
Existe uma obra, editada no Rio de Janeiro, com a segunda edição em 1956, chamada A vida trágica e amorosa de Luiz Philippe de Saldanha da Gama, que conta, em versão romanceada, o envolvimento de Mila com o Tenente Saldanha da Gama, que na época, em Itaqui, ainda não tinha 20 anos, com muitos detalhes da família e com fotos de Emília. O casamento, mesmo contra a vontade do pai, aconteceu em Itaqui, em 28 de janeiro de 1850, pelo padre Passos e com o testemunho do Chefe da Divisão Naval do Alto Uruguai, Vitorino José Barbosa de Lomba, sendo um dos acontecimentos sociais de maior evidência da Villa de Itaqui, na época. A obra citada, uma raridade, temos-na em nosso acervo.
Os comentários da época são os mais diversos. Há referência de que Saldanha soubera de que Mila andava trocando olhares com Israel Coriolano de Sousa Passos, filho do padre José Coriolano. Saldanha longe, ela aqui. As fofocas proliferavam. Ainda mais, depois que o pai de Luís Felipe soube de toda a tramoia do filho.
Saldanha da Gama, após 8 dias de casado, é convocado para a frente de batalha. Abandona seu navio Taquary, da Flotilha do Alto Uruguai, e apresenta-se ao navio-bombardeiro Forte de Coimbra. Trocam correspondência por 4 anos, mas não se reencontram mais.
Oito anos mais tarde, Mila conhece o fazendeiro Antonio José de Barcellos, de Santiago do Boqueirão, com quem se une e teve a filiação já citada.
Emilia Josefina vai mais tarde morar no Rio de Janeiro, com a neta Dalila Frota de Mattos. Em 28 de julho de 1931 sofre um acidente de carro na praia da Guanabara, com forte lesão na cabeça.
Nesse período já contava com 81 anos. Após esse acidente, a idosa passou a apresentar sinais de alienação mental. Pouco tempo depois, em 28 de julho de 1931, na rua Copacana, no Palácio Império, onde residia no apartamento 44, do 6.º andar, Mila suicida-se jogando-se da janela, tendo morte instantânea.
Foi enterrada no Cemitério São João Batista, durante 60 meses. Mais tarde, seus restos foram transladados para Santiago do Boqueirão, em 5 de outubro de 1936. O acidente de carro e o suicídio tiveram repercussão em jornais do Rio Janeiro, como por exemplo: Diário Carioca, edição 1003, página, Jornal A Esquerda, edição de 02/10/1931, Jornal A Batalha, edição 537, página 8, A Esquerda, edição 01090, de 29/07/1931.
Seu esposo, tenente, mais tarde Almirante Saldanha da Gama morreu em combate na Revolução Federalista, em 24 de junho de 1895, na região de Quaraí, no local denominado Campo Osório.
Há um relato de que Mila fora enterrada no mesmo cemitério onde jazia seu primeiro amor – o Tenente da Marinha, Saldanha da Gama. Inclusive, parece que estariam muito próximos na localização dos túmulos.
Seu segundo companheiro, Antonio José de Barcellos, faleceu em Itaqui, em 1885, deixando um testamento reconhecendo 10 filhos com três mulheres, sendo a última, Mila.
Muitos dados da filiação de Emilia com Antonio José de Barcellos ainda necessitam de confirmação, assim como a verdade sobre a não concretização do casamento dela com Luiz Felipe Saldanha da Gama. Os biógrafos do Almirante silenciam sobre esse fato. Informações outras dão conta de que Emilia teria requisitado, já viúva de Barcellos, pensão, através da Marinha, por parte de Saldanha da Gama. Não se sabe se foi atendida. Esta história ainda não está bem contada. Quem sabe o futuro traga respostas. Ou quem sabe o futuro não tenha nenhuma dessas respostas.

Belo material para um romance de época, com pitadas de realidade e ficção.

sábado, 9 de setembro de 2017

Insurreição no Vapor Taquary da Flotilha do Alto Uruguai -1867

Insurreição no Vapor Taquary da Flotilha do Alto Uruguai – 1867.

Gritos de vivas e urras! Incêndio no paiol!
Tiros e correrias no Itaqui antigo.

Ilustração de Gracco Bonetti. Na época da insurreição este prédio não existia.

Prof.º Paulo Santos
Havia pouco tempo que a Flotilha do Alto Uruguai tinha sido instalada na margem do rio Uruguai, bem próxima à boca do Cambaí.
Um grande levante de marinheiros ocorrera no dia 15 de julho de 1867.
O vapor de guerra Taquary teve um princípio de insurreição, que se efetivou, de fato, no dia seguinte. A marinhagem se insubordinou e a confusão tomou conta.
Incialmente soaram três tiros de clavina, toda guarnição de bordo se levantou. Logo em seguida, mais de 60 tiros de revólver. Interessante que ninguém morreu ou sequer ficou ferido.
Era comandante desta flotilha, pelos registros, o Capitão-tenente Francisco da Costa Vidal, pai do mais tarde Major Antonio Vidal, proprietário do anteriormente denominado Castelinho dos Barbosa. Ele fora mandado para Itaqui em 1865, cuja região estava na mira da invasão do Paraguai. Menos de um ano depois desse incidente, o comandante Vidal era reformado, visto sofrer de “moléstias incuráveis”. Foi reformado como Capitão-de-fragata.
Engraçado como era o vai-e-vem das conquistas e fracassos.
Pois esse mesmo comandante da flotilha, quando do incidente do Vapor Taquary, dois meses antes, em 21 de junho de 1867 era condecorado pelo Ministério do Império com Cavaleiro da Ordem de Rosa, juntamente com o 1.º Tenente, Estanislau Prezewodowski. O mesmo comandante do Incidente de Alvear de 1874.
Vidal e Prezewodowski – heróis num momento, vilões noutro! São os reveses da história.  
O motivo da revolta deu-se porque o comandante queria castigar a um carpinteiro por insubordinação. O castigo seria algumas chibatadas, o que era permitido pelo regulamento militar de então. Os companheiros do dito marinheiro não aceitaram e protestaram veementemente. O próprio carpinteiro também não acatou tal punição.
O fato foi comunicado ao cônsul da Argentina e a outras autoridades.
Toda esta notícia foi veiculada pelo jornal O Mercantil, de Santa Catarina, em sua edição de 19 de setembro de 1867. O semanário reforça que a população retirou-se para o centro da cidade. Até  alguns tiros foram disparados em direção ao povo.
Pesquisando em outros jornais, verificamos que este não fora um fato isolado. Em 22 de maio de 1867 houve incêndio no paiol de fardamentos desse mesmo vapor.
E para completar, quando transcorrera um ano da insurreição (1868), um novo levante ocorre no Vapor Taquary. Toda a marinhagem aderiu, sendo cabeça da rebelião um sargento de imperiais.
Parece que fora prometida uma gratificação para a guarnição pela mesma ter feito lenha. Tal soma não foi paga. A coisa foi tão feia que se formou um conluio para assassinar o comandante.
O jornal que cita este outro fato, em dado momento refere-se ao motim na “malfadada flotilha do Uruguay”. Parece que em sua fase inicial esta unidade não era vista com bons olhos, tampouco havia um controle efetivo dos comandos superiores aqui.
Com tempo, observa-se que investimentos ocorreram e o arsenal tornou-se um centro de referência de segurança nacional de fronteira. Mais tarde, até notícias boas surgem, vindas desta unidade militar da marinha brasileira. Como, por exemplo, em 20 de agosto de 1882, o jornal A Gazeta do Sul, de Itaqui, dá notícia de que um espingardeiro da Flotilha do Alto Uruguay, chamado José de Sousa Carneiro, havia inventado uma metralhadora. Isso era um fato e tanto para a época!
Nem só coisas negativas aconteciam. Dez anos após a insurreição do Taquary, em julho de 1877, o ministro da marinha mandou louvar os oficiais e praças das guarnições dos navios da Flotilha do Alto Uruguay pelo ato filantrópico de se cotizarem e conseguirem dinheiro para comprar a carta de alforria de um ajudante de cozinheiro, reclamado como escravo. A própria nota ressalta que “nunca houve louvor mais bem merecido”. E olhe que isso foi quase uma década antes da extinção da escravatura pelo regime imperial através de um canetaço da Princesa Isabel.
Ressalta-se ainda que um gesto semelhante acontecera muito antes. Em novembro de 1873, o ajudante general da armada mandara elogiar os oficiais e marinheiros desta flotilha por praticarem o mesmo gesto, libertando um indivíduo que, depois de alistado voluntariamente na armada, foi reclamado como escravo.
Um pouco antes do episódio da sublevação no Vapor Taquary, o legendário General Osório cruzara por Itaqui com seu estado maior. Ainda estávamos sobre os rescaldos da guerra do Paraguai, que durou quase cinco anos. Um jornal de Vitória, Espírito Santo, de 1867, noticiava o fato e dizia que “Osório já está quase bom da perna e já viaja a cavalo”.
Interessante, de longe, muito longe vinham notícias de Itaqui.
Curiosos esses flagrantes do passado!
A história de marinha de guerra no território itaquiense é riquíssima. Olhem só o inusitado acontecendo. Em 1867 e 1868 ocorreram insurreições no Vapor de guerra Taquary. Esse mesmo vapor que em dezembro de 1865 recebeu como prisioneiros de guerra, nada mais nada menos do que a mulher e uma filha do comandante paraguaio Estigarribia. Na época, este barco ainda não era da flotilha. Esses familiares foram entregues aos marinheiros e foguistas do vapor.
Voltando à insurreição no Vapor Taquary, em 15 de julho de 1867, o governo imperial não deixou por menos. O comandante da fronteira de São Borja, Tenente-coronel José Joaquim de Assumpção embarcou no vapor de guerra Tramandahy, com 120 praças, vindo para Itaqui.
Foram presos todos os revoltosos. Dia 19 de julho terminou a revolta, ficando trancafiados em Itaqui 29 marinheiros e mandados para a cadeia de São Borja mais 20.

Quem hoje passa pelas cercanias do Círculo Militar, hoje chamado de Hotel de Trânsito dos Militares do Exército, não imagina o quanto de história por ali rolou. E foram tantas. E foram muitas. Aos poucos vamos resgatando.

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