sábado, 9 de setembro de 2017

Insurreição no Vapor Taquary da Flotilha do Alto Uruguai -1867

Insurreição no Vapor Taquary da Flotilha do Alto Uruguai – 1867.

Gritos de vivas e urras! Incêndio no paiol!
Tiros e correrias no Itaqui antigo.

Ilustração de Gracco Bonetti. Na época da insurreição este prédio não existia.

Prof.º Paulo Santos
Havia pouco tempo que a Flotilha do Alto Uruguai tinha sido instalada na margem do rio Uruguai, bem próxima à boca do Cambaí.
Um grande levante de marinheiros ocorrera no dia 15 de julho de 1867.
O vapor de guerra Taquary teve um princípio de insurreição, que se efetivou, de fato, no dia seguinte. A marinhagem se insubordinou e a confusão tomou conta.
Incialmente soaram três tiros de clavina, toda guarnição de bordo se levantou. Logo em seguida, mais de 60 tiros de revólver. Interessante que ninguém morreu ou sequer ficou ferido.
Era comandante desta flotilha, pelos registros, o Capitão-tenente Francisco da Costa Vidal, pai do mais tarde Major Antonio Vidal, proprietário do anteriormente denominado Castelinho dos Barbosa. Ele fora mandado para Itaqui em 1865, cuja região estava na mira da invasão do Paraguai. Menos de um ano depois desse incidente, o comandante Vidal era reformado, visto sofrer de “moléstias incuráveis”. Foi reformado como Capitão-de-fragata.
Engraçado como era o vai-e-vem das conquistas e fracassos.
Pois esse mesmo comandante da flotilha, quando do incidente do Vapor Taquary, dois meses antes, em 21 de junho de 1867 era condecorado pelo Ministério do Império com Cavaleiro da Ordem de Rosa, juntamente com o 1.º Tenente, Estanislau Prezewodowski. O mesmo comandante do Incidente de Alvear de 1874.
Vidal e Prezewodowski – heróis num momento, vilões noutro! São os reveses da história.  
O motivo da revolta deu-se porque o comandante queria castigar a um carpinteiro por insubordinação. O castigo seria algumas chibatadas, o que era permitido pelo regulamento militar de então. Os companheiros do dito marinheiro não aceitaram e protestaram veementemente. O próprio carpinteiro também não acatou tal punição.
O fato foi comunicado ao cônsul da Argentina e a outras autoridades.
Toda esta notícia foi veiculada pelo jornal O Mercantil, de Santa Catarina, em sua edição de 19 de setembro de 1867. O semanário reforça que a população retirou-se para o centro da cidade. Até  alguns tiros foram disparados em direção ao povo.
Pesquisando em outros jornais, verificamos que este não fora um fato isolado. Em 22 de maio de 1867 houve incêndio no paiol de fardamentos desse mesmo vapor.
E para completar, quando transcorrera um ano da insurreição (1868), um novo levante ocorre no Vapor Taquary. Toda a marinhagem aderiu, sendo cabeça da rebelião um sargento de imperiais.
Parece que fora prometida uma gratificação para a guarnição pela mesma ter feito lenha. Tal soma não foi paga. A coisa foi tão feia que se formou um conluio para assassinar o comandante.
O jornal que cita este outro fato, em dado momento refere-se ao motim na “malfadada flotilha do Uruguay”. Parece que em sua fase inicial esta unidade não era vista com bons olhos, tampouco havia um controle efetivo dos comandos superiores aqui.
Com tempo, observa-se que investimentos ocorreram e o arsenal tornou-se um centro de referência de segurança nacional de fronteira. Mais tarde, até notícias boas surgem, vindas desta unidade militar da marinha brasileira. Como, por exemplo, em 20 de agosto de 1882, o jornal A Gazeta do Sul, de Itaqui, dá notícia de que um espingardeiro da Flotilha do Alto Uruguay, chamado José de Sousa Carneiro, havia inventado uma metralhadora. Isso era um fato e tanto para a época!
Nem só coisas negativas aconteciam. Dez anos após a insurreição do Taquary, em julho de 1877, o ministro da marinha mandou louvar os oficiais e praças das guarnições dos navios da Flotilha do Alto Uruguay pelo ato filantrópico de se cotizarem e conseguirem dinheiro para comprar a carta de alforria de um ajudante de cozinheiro, reclamado como escravo. A própria nota ressalta que “nunca houve louvor mais bem merecido”. E olhe que isso foi quase uma década antes da extinção da escravatura pelo regime imperial através de um canetaço da Princesa Isabel.
Ressalta-se ainda que um gesto semelhante acontecera muito antes. Em novembro de 1873, o ajudante general da armada mandara elogiar os oficiais e marinheiros desta flotilha por praticarem o mesmo gesto, libertando um indivíduo que, depois de alistado voluntariamente na armada, foi reclamado como escravo.
Um pouco antes do episódio da sublevação no Vapor Taquary, o legendário General Osório cruzara por Itaqui com seu estado maior. Ainda estávamos sobre os rescaldos da guerra do Paraguai, que durou quase cinco anos. Um jornal de Vitória, Espírito Santo, de 1867, noticiava o fato e dizia que “Osório já está quase bom da perna e já viaja a cavalo”.
Interessante, de longe, muito longe vinham notícias de Itaqui.
Curiosos esses flagrantes do passado!
A história de marinha de guerra no território itaquiense é riquíssima. Olhem só o inusitado acontecendo. Em 1867 e 1868 ocorreram insurreições no Vapor de guerra Taquary. Esse mesmo vapor que em dezembro de 1865 recebeu como prisioneiros de guerra, nada mais nada menos do que a mulher e uma filha do comandante paraguaio Estigarribia. Na época, este barco ainda não era da flotilha. Esses familiares foram entregues aos marinheiros e foguistas do vapor.
Voltando à insurreição no Vapor Taquary, em 15 de julho de 1867, o governo imperial não deixou por menos. O comandante da fronteira de São Borja, Tenente-coronel José Joaquim de Assumpção embarcou no vapor de guerra Tramandahy, com 120 praças, vindo para Itaqui.
Foram presos todos os revoltosos. Dia 19 de julho terminou a revolta, ficando trancafiados em Itaqui 29 marinheiros e mandados para a cadeia de São Borja mais 20.

Quem hoje passa pelas cercanias do Círculo Militar, hoje chamado de Hotel de Trânsito dos Militares do Exército, não imagina o quanto de história por ali rolou. E foram tantas. E foram muitas. Aos poucos vamos resgatando.

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