Insurreição
no Vapor Taquary da Flotilha do Alto Uruguai – 1867.
Gritos
de vivas e urras! Incêndio no paiol!
Tiros
e correrias no Itaqui antigo.
Ilustração de Gracco Bonetti. Na época da insurreição este prédio não existia. |
Prof.º Paulo Santos
Havia
pouco tempo que a Flotilha do Alto Uruguai tinha sido instalada na margem do
rio Uruguai, bem próxima à boca do Cambaí.
Um grande
levante de marinheiros ocorrera no dia 15 de julho de 1867.
O vapor
de guerra Taquary teve um princípio de insurreição, que se efetivou, de fato,
no dia seguinte. A marinhagem se insubordinou e a confusão tomou conta.
Incialmente
soaram três tiros de clavina, toda guarnição de bordo se levantou. Logo em
seguida, mais de 60 tiros de revólver. Interessante que ninguém morreu ou
sequer ficou ferido.
Era comandante
desta flotilha, pelos registros, o Capitão-tenente
Francisco da Costa Vidal, pai do
mais tarde Major Antonio Vidal,
proprietário do anteriormente denominado Castelinho dos Barbosa. Ele fora
mandado para Itaqui em 1865, cuja região estava na mira da invasão do Paraguai.
Menos de um ano depois desse incidente, o comandante Vidal era reformado, visto
sofrer de “moléstias incuráveis”. Foi reformado como Capitão-de-fragata.
Engraçado
como era o vai-e-vem das conquistas e fracassos.
Pois
esse mesmo comandante da flotilha, quando do incidente do Vapor Taquary, dois
meses antes, em 21 de junho de 1867 era condecorado pelo Ministério do Império
com Cavaleiro da Ordem de Rosa, juntamente com o 1.º Tenente, Estanislau Prezewodowski. O mesmo
comandante do Incidente de Alvear de 1874.
Vidal
e Prezewodowski – heróis num momento, vilões noutro! São os reveses da
história.
O motivo
da revolta deu-se porque o comandante queria castigar a um carpinteiro por
insubordinação. O castigo seria algumas chibatadas, o que era permitido pelo
regulamento militar de então. Os companheiros do dito marinheiro não aceitaram
e protestaram veementemente. O próprio carpinteiro também não acatou tal
punição.
O fato
foi comunicado ao cônsul da Argentina e a outras autoridades.
Toda
esta notícia foi veiculada pelo jornal O Mercantil, de Santa Catarina, em sua
edição de 19 de setembro de 1867. O semanário reforça que a população
retirou-se para o centro da cidade. Até alguns
tiros foram disparados em direção ao povo.
Pesquisando
em outros jornais, verificamos que este não fora um fato isolado. Em 22 de maio
de 1867 houve incêndio no paiol de fardamentos desse mesmo vapor.
E para
completar, quando transcorrera um ano da insurreição (1868), um novo levante
ocorre no Vapor Taquary. Toda a marinhagem aderiu, sendo cabeça da rebelião um
sargento de imperiais.
Parece
que fora prometida uma gratificação para a guarnição pela mesma ter feito
lenha. Tal soma não foi paga. A coisa foi tão feia que se formou um conluio
para assassinar o comandante.
O jornal
que cita este outro fato, em dado momento refere-se ao motim na “malfadada
flotilha do Uruguay”. Parece que em sua fase inicial esta unidade não era vista
com bons olhos, tampouco havia um controle efetivo dos comandos superiores
aqui.
Com tempo,
observa-se que investimentos ocorreram e o arsenal tornou-se um centro de
referência de segurança nacional de fronteira. Mais tarde, até notícias boas
surgem, vindas desta unidade militar da marinha brasileira. Como, por exemplo,
em 20 de agosto de 1882, o jornal A Gazeta do Sul, de Itaqui, dá notícia de que
um espingardeiro da Flotilha do Alto Uruguay, chamado José de Sousa Carneiro,
havia inventado uma metralhadora. Isso era um fato e tanto para a época!
Nem só
coisas negativas aconteciam. Dez anos após a insurreição do Taquary, em julho
de 1877, o ministro da marinha mandou louvar os oficiais e praças das
guarnições dos navios da Flotilha do Alto Uruguay pelo ato filantrópico de se cotizarem
e conseguirem dinheiro para comprar a carta de alforria de um ajudante de
cozinheiro, reclamado como escravo. A própria nota ressalta que “nunca houve
louvor mais bem merecido”. E olhe que isso foi quase uma década antes da
extinção da escravatura pelo regime imperial através de um canetaço da Princesa
Isabel.
Ressalta-se
ainda que um gesto semelhante acontecera muito antes. Em novembro de 1873, o
ajudante general da armada mandara elogiar os oficiais e marinheiros desta
flotilha por praticarem o mesmo gesto, libertando um indivíduo que, depois de
alistado voluntariamente na armada, foi reclamado como escravo.
Um pouco
antes do episódio da sublevação no Vapor Taquary, o legendário General Osório
cruzara por Itaqui com seu estado maior. Ainda estávamos sobre os rescaldos da
guerra do Paraguai, que durou quase cinco anos. Um jornal de Vitória, Espírito
Santo, de 1867, noticiava o fato e dizia que “Osório já está quase bom da perna
e já viaja a cavalo”.
Interessante,
de longe, muito longe vinham notícias de Itaqui.
Curiosos
esses flagrantes do passado!
A história
de marinha de guerra no território itaquiense é riquíssima. Olhem só o
inusitado acontecendo. Em 1867 e 1868 ocorreram insurreições no Vapor de guerra
Taquary. Esse mesmo vapor que em dezembro de 1865 recebeu como prisioneiros de
guerra, nada mais nada menos do que a mulher e uma filha do comandante
paraguaio Estigarribia. Na época, este barco ainda não era da flotilha. Esses familiares
foram entregues aos marinheiros e foguistas do vapor.
Voltando
à insurreição no Vapor Taquary, em 15 de julho de 1867, o governo imperial não
deixou por menos. O comandante da fronteira de São Borja, Tenente-coronel José Joaquim
de Assumpção embarcou no vapor de guerra Tramandahy, com 120 praças, vindo para
Itaqui.
Foram
presos todos os revoltosos. Dia 19 de julho terminou a revolta, ficando trancafiados
em Itaqui 29 marinheiros e mandados para a cadeia de São Borja mais 20.
Quem
hoje passa pelas cercanias do Círculo Militar, hoje chamado de Hotel de
Trânsito dos Militares do Exército, não imagina o quanto de história por ali
rolou. E foram tantas. E foram muitas. Aos poucos vamos resgatando.
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